segunda-feira, dezembro 05, 2005
unos cuantos piquetitos *
nunca conseguirei juntar-te toda / 1998
bilbau/2003
img da exposição world press photo 05
img da exposição anschool II / thomas hirschhorn
(* título de uma obra de Frida Kahlo)
sexta-feira, dezembro 02, 2005
mapas de (des)orientação (we´re on the road to nowhere 5)
nina katchadourian/1997/ mapa de estradas recortado
quinta-feira, dezembro 01, 2005
segunda-feira, novembro 28, 2005
terça-feira, novembro 08, 2005
quinta-feira, novembro 03, 2005
a gralha negra em tempo de chuva*
Lá no alto, num ramo firme
arqueia-se uma gralha negra toda molhada
arranjando e voltando a arranjar as penas à chuva.
Não espero qualquer milagre
nem nada
que venha lançar lançar fogo à paisagem
no interior dos meus olhos, nem procuro
mais no tempo inconstante qualquer desígnio,
mas deixo as folhas manchadas cair conforme caem,
sem cerimónia ou maravilha.
Embora - admito-o - deseje
ocasionalmente alguma resposta
do céu mudo, não posso honestamente queixar-me:
uma certa luz pode ainda
surgir incandescente
da mesa da cozinha ou da cadeira
como se um fogo celestial tornasse
seu, de um instante para outro, os mais estranhos objectos,
assim consagrando um intervalo
de outro modo inconsequente
por nos dar grandeza e glória,
ou até amor. De qualquer modo, caminho agora
atenta (pois isso poderia acontecer
mesmo nesta paisagem triste e arruinada); descrente,
mas astuta, ignorante
de que um anjo se decida a resplandecer
repentinamente a meu lado. Apenas sei que uma gralha
ordenando as suas penas negras pode brilhar
de tal maneira que prenda a minha atenção, erga
as minhas pálpebras, e conceda
um breve repouso com medo
de uma neutralidade total. Com sorte,
viajando teimosamente por esta estação
de fadiga, acabarei
por juntar um conjunto
de coisas. Os milagres acontecem
se gostares de invocar aqueles espasmódicos
gestos de luminosos milagres. A espera recomeçou de novo,
a longa espera pelo anjo,
por essa rara, fortuita visita.
*/sylvia plath
arqueia-se uma gralha negra toda molhada
arranjando e voltando a arranjar as penas à chuva.
Não espero qualquer milagre
nem nada
que venha lançar lançar fogo à paisagem
no interior dos meus olhos, nem procuro
mais no tempo inconstante qualquer desígnio,
mas deixo as folhas manchadas cair conforme caem,
sem cerimónia ou maravilha.
Embora - admito-o - deseje
ocasionalmente alguma resposta
do céu mudo, não posso honestamente queixar-me:
uma certa luz pode ainda
surgir incandescente
da mesa da cozinha ou da cadeira
como se um fogo celestial tornasse
seu, de um instante para outro, os mais estranhos objectos,
assim consagrando um intervalo
de outro modo inconsequente
por nos dar grandeza e glória,
ou até amor. De qualquer modo, caminho agora
atenta (pois isso poderia acontecer
mesmo nesta paisagem triste e arruinada); descrente,
mas astuta, ignorante
de que um anjo se decida a resplandecer
repentinamente a meu lado. Apenas sei que uma gralha
ordenando as suas penas negras pode brilhar
de tal maneira que prenda a minha atenção, erga
as minhas pálpebras, e conceda
um breve repouso com medo
de uma neutralidade total. Com sorte,
viajando teimosamente por esta estação
de fadiga, acabarei
por juntar um conjunto
de coisas. Os milagres acontecem
se gostares de invocar aqueles espasmódicos
gestos de luminosos milagres. A espera recomeçou de novo,
a longa espera pelo anjo,
por essa rara, fortuita visita.
*/sylvia plath
quarta-feira, outubro 26, 2005
segunda-feira, outubro 24, 2005
para elsinore
1
Cheirava a mar em Elsinore
Um leve cheiro a mar misturado
Com o aroma primaveril de ervas e arvoredo
O castelo fora por vezes reconstruído
E uma vez purificado pelo fogo
Tudo fora lavado e pintado
Passado a limpo e exorcizado
No entanto
Numa das salas do castelo
Um quadro do século dezoito mostrava
Uma rainha bela imperiosa arrogante
E no seu rosto a sombra de outro se espelhava
E também as muralhas vermelhas de tijolo
sobre as águas obscuras do fosso projectavam
Uma sombra muito antiga e cor de sangue
2
Cá fora o mar era de um azul claríssimo
Crianças brincavam na relva à luz do sol
E famílias felizes de perto as olhavam
Porém a guia disse que o passado mora do outro lado do castelo
E que o pano só sobe depois do sol descer
E que as palavras só se cruzam como facas
Quando soa a hora em que se embruxa a noite
Eu entre barco e avião cheguei desencontrada
Nada vi da profunda e visionária noite
(sophia de mello breyner)
sábado, outubro 15, 2005
a condição humana
saraband, ingmar bergman, 2004
terça-feira, outubro 11, 2005
segunda-feira, outubro 10, 2005
quarta-feira, setembro 21, 2005
sábado, setembro 17, 2005
terça-feira, setembro 13, 2005
Quando alguém parte, tem de deitar
ao mar o chapéu com as conchas
apanhadas ao longo do verão,
e ir-se com o cabelo ao vento,
tem de lançar ao mar
a mesa que pôs para o seu amor,
tem de lançar ao mar
o resto de vinho que ficou no copo,
tem de dar o seu pão aos peixes
e misturar no mar uma gota de sangue,
tem de espetar bem a faca nas ondas
e afundar o sapato,
coração, âncora e cruz,
e ir-se com o cabelo ao vento!
Depois, regressará,
Quando?
Não perguntes.
quinta-feira, setembro 08, 2005
um jardim de betão à beira mar plantado ou quando o 'progresso' entra pela porta sai tudo pela janela
temo muito seriamente que o que actualmente é assim
se transforme nos próximos anos nisto
estão previstas para a freguesia de Melides perto de 6000 novas camas entre as 50 000 mil que se espera para toda a zona que sobe dali até Tróia
o presidente da câmara municipal de Grândola já afirmou que com ou sem despacho ministerial a coisa vai avançar
é preciso mais?
imagens Google Earth (http://earth.google.com)
se transforme nos próximos anos nisto
estão previstas para a freguesia de Melides perto de 6000 novas camas entre as 50 000 mil que se espera para toda a zona que sobe dali até Tróia
o presidente da câmara municipal de Grândola já afirmou que com ou sem despacho ministerial a coisa vai avançar
é preciso mais?
imagens Google Earth (http://earth.google.com)
quarta-feira, agosto 31, 2005
botânica II
O silêncio das plantas
O conhecimento entre mim e vós
não se vai desenvolvendo mal de todo.
Sei o que é uma folha, um espinho, uma pinha, um caule,
o que convosco se passa em Abril, o que em Maio.
E embora a minha curiosidade não tenha o seu recíproco,
sobre algumas me debruço especialmente,
e para algumas de vós ergo a cabeça.
Há nomes vossos em mim:
o ácer, o lódão, a hepática,
dedaleira, zimbro, visgo, malmequer.
A nossa viagem é conjunta.
E é claro que durante as nossas viagens conjuntas se conversa,
uma troca de reparos que seja sobre o tempo,
sobre as estações velozmente ultrapassadas.
Temas não faltariam porque imensa coisa nos liga.
Aquela mesma estrela nos tem ao seu alcance.
Lançamos sombra sob idênticas leis.
tentamos saber algo, cada um à sua maneira,
e até no que ignoramos há semelhança.
Esclareço o que posso mas perguntem:
que é isso de ter olhos para olhar,
por que me bate o coração,
e por que não tenho o corpo com raízes.
Mas como dar resposta a perguntas por fazer,
se ainda por cima se é alguém
tão para vocês coisa nenhuma.
Prados e juncos, pinhais novos, epífitos –
tudo o que vos digo é um monólogo
e vocês não escutam.
A conversa convosco é necessária e impossível.
urgente na vida célere
e adiada para nunca.
wislawa szymborska
O conhecimento entre mim e vós
não se vai desenvolvendo mal de todo.
Sei o que é uma folha, um espinho, uma pinha, um caule,
o que convosco se passa em Abril, o que em Maio.
E embora a minha curiosidade não tenha o seu recíproco,
sobre algumas me debruço especialmente,
e para algumas de vós ergo a cabeça.
Há nomes vossos em mim:
o ácer, o lódão, a hepática,
dedaleira, zimbro, visgo, malmequer.
A nossa viagem é conjunta.
E é claro que durante as nossas viagens conjuntas se conversa,
uma troca de reparos que seja sobre o tempo,
sobre as estações velozmente ultrapassadas.
Temas não faltariam porque imensa coisa nos liga.
Aquela mesma estrela nos tem ao seu alcance.
Lançamos sombra sob idênticas leis.
tentamos saber algo, cada um à sua maneira,
e até no que ignoramos há semelhança.
Esclareço o que posso mas perguntem:
que é isso de ter olhos para olhar,
por que me bate o coração,
e por que não tenho o corpo com raízes.
Mas como dar resposta a perguntas por fazer,
se ainda por cima se é alguém
tão para vocês coisa nenhuma.
Prados e juncos, pinhais novos, epífitos –
tudo o que vos digo é um monólogo
e vocês não escutam.
A conversa convosco é necessária e impossível.
urgente na vida célere
e adiada para nunca.
wislawa szymborska
botânica I
os dias encheram-se de nomes :
lonicera japonica, wisteria sinensis, bellis perennis, crassula argentea, sempervivum zeloborii
dei por mim viciada em terra
lonicera japonica, wisteria sinensis, bellis perennis, crassula argentea, sempervivum zeloborii
dei por mim viciada em terra
segunda-feira, agosto 15, 2005
entranharam-se nos meus dias
alentejo 2005
quando conto até sessenta sob a luz vermelha eles aparecem mais uma vez
o tempo encarrega-se sempre de nos descarnar
sobre a terra sobram-nos os ossos
sábado, agosto 13, 2005
sábado, julho 30, 2005
quinta-feira, julho 21, 2005
terça-feira, julho 19, 2005
quinta-feira, julho 14, 2005
quinta-feira, junho 30, 2005
tactear para ver no escuro II
Saía do escuro desfiladeiro. Em boa verdade, já por várias vezes de lá saíra. E havia de sair ainda. Os tratados consagrados à aventura do espírito enganavam-se ao atribuírem a essa aventura sucessivas fases: tudo se confundia, pelo contrário, tudo estava sujeito a ser infinitamente repisado, repetido. A demanda do espírito processava-se em círculo. Dantes, em Basileia, e em vários outros lugares, passara por idêntica escuridão. As mesmas verdades haviam sido reaprendidas várias vezes. Mas a experiência era cumulativa: o passo, com o tempo, tornava-se cada vez mais seguro; o olhar ganhava mais alcance no meio de certas trevas; o espírito constatava, pelo menos, certas e determinadas leis. Como um homem que sobe, ou quiçá desce a falda de uma montanha, assim ele se elevava ou se enterrava sem sair do mesmo sítio; pelo menos, em cada curva, um novo abismo se erguia, ora à direita, ora à esquerda. A ascenção só podia medir-se pelo ar que ia rareando e pelos diferentes cumes que apontavam por detrás daqueles que já pareciam haver ocultado o horizonte. Era, porém, falsa a noção de ascenção ou de descida: os astros tanto brilhavam em cima como em baixo; e ele tanto se achava no fundo do abismo como no centro. O abismo estava, ao mesmo tempo, para além da esfera celeste e no interior da cúpula óssea. Tudo parecia processar-se no extremo limite de uma série infinita de curvas fechadas.
marguerite yourcenar / a obra ao negro, segunda parte: a vida imóvel
quarta-feira, junho 29, 2005
terça-feira, junho 28, 2005
sexta-feira, junho 24, 2005
hanabi ou planando sob o jacarandá
mas nessa altura dançavam pelas ruas fora, quais fantoches febris, e eu trotava atrás deles, como toda a vida fiz no encalço das pessoas que me interessam, porque as únicas pessoas autênticas, para mim, são as loucas, as que estão loucas por viver, loucas por falar, loucas por serem salvas, desejosas de tudo ao mesmo tempo, as que não bocejam nem dizem nenhum lugar comum, mas ardem, ardem, ardem como fabulosas grinaldas amarelas de fogo-de-artifício a explodir, semelhantes a aranhas, através das estrelas e, no meio, vê-se o clarão azul a estourar e toda a gente exclama: Aaaah!
(jack kerouac chegado através do v.b.)
(pinturas de takeshi kitano)
os dias de s. joão são sempre lentos para poder saborear a memória dos meus amores planando em voo raso debaixo do jacarandá
Subscrever:
Mensagens (Atom)