O primeiro contacto é de expectativa.
Vais entrar num outro elemento, desconheces ainda como actuar.
Mergulhas. Agora, o teu único elo com o mundo são os pulmões. Só eles não se submetem, exigindo ar, exigindo que continues viva da única forma que aprendeste. São ainda matéria exalando coágulos de ar que rebentam à superfície da água e que te obrigam a emergir uma e outra vez abrindo a garganta ao mundo. Os pulmões não têm memória - esqueceram a dor da primeira respiração.
Assemelhas-te a uma medusa.
Os teus braços e pernas, os músculos que te impulsionam, que estremecem de esforço quando expostos à terra e ao ar, já não são carne e não lhes sentes o peso esmagador. A dor da lei da gravidade cessou e a levitação não é mais um artifício mágico.
Mergulhas mais profundamente e o som do mundo é-te devolvido em ruídos desconexos. Sem ar todas as palavras se tornam indizíveis e é necessário aprender uma nova linguagem e assim transformas-te numa nadadora.
Deslizas, de olhos bem abertos, sentindo os halos de luz que chocam contra o teu corpo.
A tua comunhão é total: a morte deve ser este esquecer da consciência dela própria, este respirar dentro de água novamente, um tempo uterino invertido. O desaparecimento é uma simetria ousada do início da vida, regrides ao estado de embrião e tornas-te água.
(fotografias: ken rosenthal / da série seen and not seen)
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